O meteorito Marília

 

Gabriel Gonçalves*

Poucas pessoas hoje em dia têm ideia do que aconteceu de especial em Marília no fim da tarde do dia 5 de Outubro de 1971. Os moradores mais novos ou que se mudaram para a cidade depois dessa época dificilmente tiveram contato com a com relatos do fato que ocorreu naquela data. Apesar disso, ainda hoje há quem se lembre com clareza daquele fim de tarde que deixou de ser igual aos outros com a chegada de um visitante do espaço.

Como dito, tudo começou por volta das 5:00 da tarde do dia 5 de Outubro de 1971, o Sol já estava baixo, aproximando-se do horizonte. Vindo da mesma direção oeste do poente, e ofuscado pelo próprio Sol, um grande meteoro, ou estrela-cadente, se dirigia à cidade de Marília. O responsável por esse bólido era uma rocha vinda do espaço, que viajava em altíssima velocidade enquanto atravessava a alta atmosfera.

As pessoas não perceberam o que estava acontecendo até que um barulho alto, parecido com um zumbido, chamasse a atenção de todos para o céu. Nesse momento muitos passaram a testemunhar os momentos finais da queda de vários fragmentos dessa rocha espacial. Após cruzar o céu, as pedras caíram em diferentes lugares, se espalhando por vários pontos da cidade.

Em casos como esse, ao tocar o solo esse tipo de rocha passa a se chamar de meteorito. Para facilitar a nomenclatura dos milhares de meteoritos conhecidos no mundo, eles recebem o nome do local onde eles caíram. Neste caso, esse meteorito passou então a se chamar Meteorito Marília.

No momento da queda, estava pela cidade o Prof. P. E Avanzo, geólogo da UFBA. O Prof. Avanzo testemunhou a queda e partiu em busca dos pedaços desta rocha conseguindo obter sete fragmentos. Em um mapa simplificado, o professor indica de maneira geral onde foram encontrados os sete fragmentos por ele recuperados.

Figura 1: Mapa feito por P. E. Avanzo mostrando os locais onde ele recolheu os 7 fragmentos logo depois da queda. (Avanzo, P.E., Levi-Donati, G. R., Sighinolfi, G. P., 1973).

Possivelmente foi no ponto indicado pelo número 1 do mapa que ocorreu o seguinte relato que foi obtido pela Professora Maria Elizabeth Zucolotto (Scorzelli, R. B. Varela, M. E., Zucolotto, E., 2010):

“Uma das amostras caiu na Rua São Carlos em frente ao Nº 392 espatifando-se sobre a calçada, não tendo por pouco atingido as crianças que ali brincavam. Segundo um deles, Marco Aurélio Beraldo, quando ouviu o barulho, olhou para cima e ainda pode ver a pedra caindo. Os populares recolheram alguns pedaços que segundo eles estavam ainda quentes. Alguns disseram que durante alguns minutos saiu fumaça de uma pequena cratera (buraco) que surgiu onde a pedra bateu.”

Sabe-se que vários outros pedaços caíram e foram recolhidos pelos moradores que quiseram guardar esse material como lembrança. Há relatos até de um fragmento que atingiu a calçada de uma escola, cujo nome não foi possível identificar. Esse fragmento foi dividido entre alguns pesquisadores e instituições de pesquisa.

Outro fragmento atingiu uma pilha de casca de café em uma fazenda na zona rural da cidade. O dono da propriedade deu esse fragmento para o dono da propriedade vizinha, que então levou o fragmento à cidade, onde ficou exposto durante algum tempo em uma emissora de rádio.

Várias pessoas relataram o espanto causado pela queda dos fragmentos de meteorito. Um jovem na época trabalhava em uma roça e ouviu o zunido, tendo tempo ainda de ver, com muito espanto, as pedras caindo do céu. Algumas pessoas já adultas na época dizem que saíram de casa para ver o que acontecia, enquanto aglomerações se formavam para ver a estranha rocha que havia caído e causado tanto barulho. A busca do Prof. Avanzo pelas pedras também chamou atenção, principalmente das pessoas que buscavam explicações para o fenômeno.

Hoje em dia, porém, a maior parte dos relatos do ocorrido é lembrada apenas na memória dos moradores, já que nos jornais da época pouco é dito. Além disso, não há informações de que tenha sobrado material desse meteorito na cidade.

Quedas de meteoritos são eventos comuns se consideramos a escala global. Todo ano vários meteoritos chegam a superfície terrestre, sendo que muitos deles acabam se perdendo nas áreas pouco povoadas, como montanhas, desertos e florestas, além daqueles que caem no mar. Ainda assim, é possível encontrar anos em que mais de dez quedas de meteoritos são testemunhadas, sem contar os meteoritos achados muitos (até milhares) de anos depois de sua queda. No mundo, são reconhecidos quase cerca de 50.000 diferentes meteoritos (sendo que pouco mais de mil foram testemunhadas). O Brasil, porém, possui apenas 62 meteoritos oficialmente reconhecidos.

Mesmo assim, testemunhar uma queda de meteorito não é algo tão comum, você tem que estar no lugar certo na hora certa. O meteorito Marília é a queda mais recente reconhecida no estado de São Paulo, sendo que só há mais duas outras quedas oficiais: uma na cidade de Avanhandava (1952) e outra em São José do Rio Preto (1962). No Brasil, a última queda registrada ocorreu em 2010 na cidade de Varre-Sai, no Rio de Janeiro.

Eventos de queda de meteoritos geralmente não são tão famosos, porém em fevereiro deste ano, uma queda muito grande foi registrada por várias câmeras no interior da Rússia. A onda de choque gerada pela passagem da grande rocha a acabou causando grandes estragos. O meteorito de Chelyabisnk, como ficou conhecido, virou assunto nos jornais pelo grande tamanho, muitas vezes maior do que o que caiu em Marília, pois nos faz lembrar os riscos que os asteroides grandes podem nos proporcionar.

Os meteoritos são materiais vindos dom espaço, mas provenientes do nosso próprio Sistema Solar. Podem possuir composições muito diferentes constituindo-se de rocha (rochosos), de liga de ferro com níquel (ferrosos) ou uma mistura dos dois (ferro-rochosos). As diferentes classificações e subclassificações dos meteoritos ajudam os cientistas a entender a origem e a evolução do Sistema Solar e da própria Terra como planeta.

O meteorito Marília, mais especificamente, é classificado como um Condrito Ordinário H4, ou seja, um meteorito de rocha, cuja origem remete a formação do Sistema Solar. Como uma analogia, podemos pensar nos meteoritos condritos ordinários como os tijolos do Sistema Solar: essas pequenas rochas de material similar foram se juntando para dar origem aos planetas rochosos (Mercúrio, Vênus, Terra e Marte). Contudo, diferentemente do material formador dos planetas citados, que derreteu e se modificou, o material que compõe o meteorito Marília sofreu pouquíssima alteração desde sua formação cerca de 4,5 bilhões de anos atrás, mantendo-se praticamente intacto.

Rochas como o meteorito Marília, em vez de se juntarem a um planeta na época de sua formação, ficaram agrupadas em pilhas menores de material que hoje chamamos de asteroides. Um pedaço desses asteroides acabou caindo na cidade em 1971 trazendo para Marília cerca de 2,5 kg de material espacial que se fragmentou nos vários pedaços encontrados naquele dia.

Um evento como esse é de importância histórica e científica. Hoje fragmentos do meteorito Marília compõem coleções particulares e públicas de várias instituições e colecionadores. Algo assim deve ser lembrado como algo único para a cidade e para os seus moradores. Poucos locais tem a chance de testemunhar algo tão fascinante e curioso como a queda de um meteorito e poucas pessoas poderão dizer que vivenciaram isso. Por isso é importante manter a memória deste fato viva entre todos os habitantes da cidade.

Figura 2: Fragmento de 351.21g que hoje faz parte do IGc/USP. Fotos gentilmente cedidas a mim pelo geólogo Ideval Souza Costa.

 

 

Referências:

Avanzo, P.E., Levi-Donati, G. R., Sighinolfi, G. P.,The Marília Meteorite Shower – A Preliminary Report. Meteoritics, 8, pag. 141-147. 1973.

Scorzelli, R. B. Varela, M. E., Zucolotto, E., Meteoritos: Cofres da Nebulosa Solar, vol.1, pag. 66. São Paulo, 2010

"Meteoritical Bulletin: Search the Database." Meteoritical Bulletin. Website < https://www.lpi.usra.edu/meteor/metbull.php>. 03 Sept. 2013.

 

*Grabriel é mestrando em Engenharia Química na Universidade Federal de São Carlos

 

 

 

Concepções interdisciplinares entre Astronomia e Química

O fascínio do homem pelo universo fez com que a Astronomia fosse considerada a primeira ciência a ser dominada pelo homem.

Desde a Antiguidade, o homem se sente fascinado pela imensidão do céu estrelado (LEITE e HOSOUME, 2007, p.48) e admira-se ao contemplar um pôr do sol magnífico. Dessa forma, não só foi possível observar extasiantes belezas, como também surgiram indagações que culminaram na criação de teorias sobre o Universo. Dentre outros fatores, tal curiosidade, que sempre intrigou crianças, jovens e adultos, fez com que a Astronomia fosse considerada a primeira ciência a ser dominada pelo homem (DIAS, 2005, p.1). Pesquisas científicas têm revelado muito sobre o funcionamento do Universo ou cosmo. Por isso, a humanidade hoje o compreende melhor – dos minúsculos componentes da matéria até as vastas dimensões do espaço. Mesmo assim, o que resta ser descoberto foge à nossa imaginação.

Segundo Dias (2005, p.1), o ensino de Astronomia constitui-se de suma importância, como um recurso que pode ser usado no aspecto interdisciplinar. Esta ciência apresenta muitos temas que despertam a atenção e a curiosidade dos alunos e que fazem parte dos conteúdos propostos pelos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs). “Os conteúdos de Astronomia há muito tempo estão presentes de alguma maneira nos programas oficiais ou livros didáticos ao longo das reformas curriculares em nosso país” (BRETONES, 2006, p.14). Outros fatores que estimulam o uso de conteúdos relacionados com esta ciência são, por exemplo, o fato de ela desenvolver noções sobre o sistema de localização, o raciocínio lógico, escalas numéricas enormes e pequenas e “talvez seja a única ciência capaz de desvendar nossas origens e criar possibilidades de abandonar o planeta em caso de uma grande catástrofe.” (DIAS, 2005, p.1). Desse modo, é de suma importância o conhecimento de Astronomia.

Tal conhecimento foi e continua sendo historicamente construído pela cultura humana – conhecimentos científico-químicos – e deve ser veiculado pela instituição social chamada escola. Por meio da mediação docente, os alunos poderão ter acesso e se apropriarão desse conhecimento (SCHNETZLER, 2004, p.49).

A Química, enquanto ciência, tem o papel de causar:

a introdução das crianças e adolescentes a uma forma diferente de pensar sobre o mundo natural e de explicá-lo; é tornar-se socializado, em maior ou menor grau, nas práticas da comunidade científica, com seus objetivos específicos, suas maneiras de ver o mundo e suas formas de dar suporte às assertivas do conhecimento (DRIVER et al., 1999, p. 36).

Partindo desse pressuposto, os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs) recomendam o ensino desse conteúdo relacionando-o a outras Ciências, como a Biologia, a Física e a Astronomia, numa perspectiva interdisciplinar composta pelo “ensino de cada disciplina e do seu conjunto” (BRASIL, 1999, p. 207).

Com base nisso, é possível identificar a estreita ligação entre a Química e a Astronomia; tanto sob o aspecto da História da Ciência, como quando se refere aos próprios conteúdos específicos de ambas as disciplinas, como:

• A origem da luz (espectroscopia, diferentes tipos de radiação, concepção do átomo como onda-partícula),

• Reações nucleares,

• Composição química das atmosferas planetárias, dentre outros.


Fontes:

Monografia de: Jennifer Rocha Vargas. “A QUÍMICA DA ASTRONOMIA: CONTRIBUIÇÕES NA FORMAÇÃO INICIAL DE PROFESSORES NUMA PERSPECTIVA INTERDISCIPLINAR”, 2010, p. 20-22.

BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Média e Tecnológica. Parâmetros Curriculares Nacionais: Ensino Médio. Brasília: Ministério da Educação, 1999.

BRETONES, P. S., A Astronomia na Formação Continuada de Professores e o Papel da Racionalidade Prática para o tema da Observação do Céu. Campinas, São Paulo, agosto de 2006. Disponível em: https://www.dme.ufscar.br/btdea/arquivos/td/2006_BRETONES_T_UNICAMP.pdf

DIAS, C. A. C. M. Inserção da Astronomia como disciplina curricular no Ensino Médio. Rio de Janeiro: Centro Federal de Educação Tecnológica - Pós-Graduação Lato-Sensu em Ensino de Astronomia, 2005. Disponível em : https://www.ebah.com.br/content/ABAAAADU8AI/insercao-astronomia-como-disciplina-curricular-ensino-medio

DRIVER, R.; ASOKO, H.; LEACH, J.; MORTIMER, E. e SCOTT, P. Constructing scientific knowledge in the classroom. Educational Researcher, n. 7, p. 5-12, 1994. Tradução de MORTIMER, E. Construindo conhecimento científico em sala de aula. Química Nova na Escola, n. 9, 1999. Disponível em: https://qnesc.sbq.org.br/online/qnesc09/aluno.pdf

LEITE, C., HOSOUME, Y. Os professores de Ciências e suas formas de pensar a astronomia. São Paulo: Revista Latino-Americana de Educação em Astronomia - RELEA, n. 4, p. 47–68, 2007. Disponível em: https://www.relea.ufscar.br/num4/A3_n4.pdf

 

SCHNETZLER, R. P. A Pesquisa no Ensino de Química e a importância da Química Nova na Escola. Química Nova na Escola, n° 20, NOVEMBRO 2004, Disponível em: https://qnesc.sbq.org.br/online/qnesc20/v20a09.pdf

 

Por Jennifer Fogaça
Graduada em Química
Equipe Brasil Escola

Disponível em: https://educador.brasilescola.com/estrategias-ensino/concepcoes-interdisciplinares-entre-astronomia-quimica.htm . Acesso em: 06/09/

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